domingo, 28 de agosto de 2011

Dejours em Curitiba (26/08/2011)

SAÚDE E SUBJETIVIDADE
Palestra de Christophe Dejours, no TRT-Curitiba.

No final da última grande guerra...
  • Houve um movimento importante de reflexão sobre a maneira de pensar das organizações, a respeito da saúde mental;
  • Começou-se a perceber e compreender os efeitos nocivos do trabalho no homem, desde o taylorismo
  • Atribuiu-se o sinônimo de infelicidade ao trabalho;
  • Identificou-se doenças mentais originadas pelo trabalho;
  • Iniciou-se a "medicina do trabalho" - toxicologia industrial, por RAMADINI;
  • Estudou-se a relação das pressões do trabalho com a saúde mental. Assim surgiu a PSICOPATOLOGIA DO TRABALHO.
Nesta época...
  • Não era possível colocar em evidência as doenças mentais específicas do trabalho. Somente o que era explícito era considerado como "doença";
  • O que intrigou os pesquisadores foi que a maioria das pessoas conseguiam permanecer "normais", frente às pressões do trabalho. E por que?
  • A conclusão foi que as pessoas não só sofrem passivamente essas pressões do trabalho, mas se defendem, lutam contra os efeitos ruins do trabalho, sobretudo para resistir e permanecerem fortes;
  • As estratégias de defesas foram inventadas pelos operários para resistir às pressões do trabalho.
Estratégias de Defesa (o tradutor falou assim e não Estratégias Defensivas) - ED
  • As primeiras  manifestações de Estratégias de Defesas deu-se na construção civil. Os trabalhadores tinham medo do trabalho perigoso. Então, inventavam ED extraordinárias para diminuir o risco. Eles transformavam o trabalho em jogos, ridicularizavam, zombavam, etc., até impondo-se a se submeter às provas, às provações. Eles precisavam mostrar a todos que não tinham medo. Dejours usa uma expressão "caminho do soldado"???. Assim, o jogo coletivo transformava tudo em brincadeira.
  • Nas centrais nucleares, por exemplo, os trabalhadores inventam ED específicas. Cada meio constrói as ED para si. São coletivas e funcionam com cooperação;
  • A saúde mental de cada um depende não só de si, mas dos outros. Mesmo o prazer no trabalho depende dos outros.
Por que a normalidade?
  • Quando as estratégias de defesas não funcionam, a doença mental se estabelece. A partir daí, não depende mais do trabalho. A descompensação depende da personalidade do indivíduo, sua situação de vida, etc., muito embora esta descompensação tenha sido gerada pelo trabalho;
  • Dejours fala que as pessoas ainda vão se matar no trabalho (na verdade já acontece isso);
  • O trabalho deve construir nossa saúde. Porque, em alguns casos há infelicidade e em outros não?
Psicodinâmica do Trabalho (PDT)
  • É o estudo da relação entre as pessoas no trabalho e os processos psíquicos;
  • Não se trata somente de pesquisa, mas de um método de intervenção, com objetivo de transformar a relação saúde e trabalho para melhor. É preciso melhorar o trabalho;
  • Condições de Trabalho (corpo) - Depende de condições químicas, físicas e biológicas;
  • Organização do Trabalho (mente) - Forma de repartição das tarefas. Não somente as tarefas técnicas,  mas envolve um método de dominação;
  • A OCT (organização científica do trabalho) foi problemática. Taylor teve que se defender perante um juri;
  • Em 1968, começou a se repensar a Organização do Trabalho, para revidar o Taylorismo/Fordismo. Então surgiu o Toyotismo, um método de dominação mais refinado.
  • As reformas na Organização do Trabalho agravaram a relação entre Trabalho e Saúde. O que aconteceu, para gerar essa degradação?
  • A PDT analisa a Organização do Trabalho, partindo da clínica, da normalidade. O que é determinante é a nova forma de dominação (sociólogos e economistas discordam aqui);
  • As pressões da nova Organização do Trabalho foram submetidas a novas técnicas.
Avaliação individualizada da performance
  • Isso nos enfraqueceu para suportar o trabalho;
  • Trata-se de uma metodologia recente, cuja força é indissociável do progresso técnico (informática veio com tudo). Isso estimulou a pesquisa e individualizou a análise do trabalho. O computador entra aqui como um "dedo duro", um avaliador impiedoso;
  • Não existe mais a relação com "alguém" mas com "algo". Um sistema avalia o indivíduo, mediante a introdução de dados do trabalho. Quando há alguma falha, isto é evidenciado que houve "erro". Há de se ter auto-controle;
  • A ajuda mútua desaparece. A avaliação individualizada destrói o mundo social do trabalho.
  • Psiquicamente, isto é uma situação nova, uma teia de contradições;
  • A OCT piorou!
  • A avaliação individual é um processo deletério ligado à Organização do Trabalho;
  • A ISO (qq uma delas) tem efeitos ruins sobre a saúde mental.
Patologias de sobrecarga
  • As pessoas adoecem mais: LER - DORT - KAROSHI (morte súbita pela sobrecarga) - BURNOUT - DOPPING (medicação para permanecer trabalhando). "Cocaína" no trabalho!!
  • O email que se envia com cópia para "n" pessoas, como forma de "prova", gerando mais sobrecarga ainda.
Concorrência exacerbada
  • Todos concorrem ente si no mundo do trabalho, muitas vezes com formas incontroláveis, desleais;
  • Não existe o sucesso para a equipe. O sucesso é individualizado. O vizinho pode te prejudicar, seu interesse pode ser te boicotar. Vc é um concorrente que deve ser "banido";
  • Há destruição da colaboração, do viver junto. Há solidão;
  • A perseguição não é algo novo. Existe desde a escravatura, exceto que, naquela época, as pessoas não estavam sozinhas. Havia solidariedade moral. Elas não adoeciam tanto;
  • Hoje, ninguém defende ninguém numa situação de insulto. Acaba que a pessoa começa a ter dúvidas de si mesmo;
  • As pessoas são convidadas a participar de atos que, normalmente, repudiariam. Talvez, há 20 anos atrás, eu mesmo testemunharia a favor de alguém, mas hoje, é preciso "matar" para "subir". Trair, puxar o tapete, destruir o oponente, o concorrente;
  • Para responder aos objetivos da empresa, a pessoa faz coisas inaceitáveis.
Patologia da Solidão
  • As decisões são solitárias. Há traição do ETHOS profissional, no fundo, a traição de si mesmo. 
  • É um problema moral e psíquico;
  • Só pode ser resolvido com solidariedade. Se for destruída no trabalho, há repercussões na vida: perda de respeito, destruição das relações entre os seres humanos.
O espaço privado tomado pela lógica do trabalho
  • Quando começa a degradar, as crianças começam também se afetadas na escola. O trabalho invade a área privada da vida pessoal;
  • O trabalho atrapalha a economia amorosa. Há perda do amor próprio. Para amar o outro, é preciso amar a si mesmo;
  • O trabalho é importante para a vida privada.
Centralidade do Trabalho
  • O trabalho está no fim? Isso é impossível! O que vai acontecer é o aumento de métodos de avaliação individual, que justifica atos desleais;
Trabalho prescrito (tarefa) x Trabalho real/efetivo (atividade)
  •  O organização técnica do trabalho não consegue prever tudo. Panes acontecem. Assim, é preciso ajustar o que foi previsto (trabalho prescrito) para o trabalho real;
  • Todo trabalhador inteligente, para que seu trabalho funcione efetivamente, não segue o trabalho prescrito;
  • A inteligência está na frente. Dejours chamou isso de "jogar sujo" (aqui talvez seja uma adaptação do tradutor);
  • As pessoas que se contentam em obedecer, fazem a GREVE DO ZELO. Elas só fazem o que são mandadas, o que dizem-lhes para fazer. Neste caso, uma central nuclear pode explodir....
Trabalho vivo
  • O trabalho vivo é a inteligência das pessoas que implica em colocar de si no trabalho, entrar de corpo e alma, estabelecer uma relação de subjetividade muito profunda;
  • Caso contrário, não existiriam bons profissionais. Mas hoje, isso é negado. As pessoas "burlam", para que tudo funcione, mas negam.... escondem isso;
  • É preciso reabilitar o trabalho;
  • As novas formas de organização do trabalho tem tendência a destruir a relação subjetiva com o trabalho;
  • Nos anos 80, a responsabilidade fundamental passou das mãos dos "engenheiros" para os "administradores", que consideram somente os resultados. A performance é controlada. Não se pode "perceber" o trabalho, "discutir" o trabalho. E isso tudo agrava o problema de saúde mental.
O futuro da Organização do Trabalho
  • Dejours acredita que não há fatalidade na evolução da organização do trabalho. É possível fazer de outra forma;
  • As pessoas reinventam formas de trabalhar, com cooperação e coletivamente;
  • COORDENAÇÃO transformada em COOPERAÇÃO;
  • Nada funciona se as pessoas somente obedecerem. É preciso interpretar as ordens (coletivamente);
  • Algumas empresas estão preocupadas com suicídios;
  • Força do trabalho vivo.