terça-feira, 9 de novembro de 2010

AULA 7 - ORGANIZAÇÃO E COMPORTAMENTO



FAE – CENTRO UNIVERSITÁRIO
PROGRAMA DE MESTRADO INTERDISCIPLINAR EM
ORGANIZAÇÕES E DESENVOLVIMENTO – PMOD
DISCIPLINA: ORGANIZAÇÕES E COMPORTAMENTO – Profª. LIS SOBOLL (RESENHA 7º. ENCONTRO)

Por Rossana Cristine Floriano Jost[1]
I.                    Identificação da obra
PAGÈS, M. et al. O Poder das Organizações. São Paulo: Atlas, 1987 (Introdução e Primeira Parte).
II.           Obras complementares
FARIA, J.H. de; MENEGHETTI, F.K. O sequestro da subjetividade e as novas formas de controle psicológico no trabalho. In: FARIA, J.H. de (organizador). Análise crítica das teorias e práticas organizacionais. São Paulo: Atlas, 2007. p. 45 a 67.
III.          Percepções da aluna
1. I n t r o d u ç ã o:
O capítulo apresenta a visão do sistema de poder da empresa TLTX, multinacional americana, de extensão comercial mundial, com um quadro de funcionários formado em grande parte por pessoas qualificadas. A TLTX produz material de alta tecnologia e se vale das mais sofisticadas técnicas de administração.
O texto inicia com a surpresa dos autores faze ao caráter contraditório do discurso dos funcionários, nas entrevistas, que, ora sentiam-se explorados, ora compreendiam a forma agradável que isso acontecia, ora aprovavam a empresa, ora a rejeitavam, e assim por diante. O discurso parecia um “encadeamento infinito de contradições ligadas umas às outras” (p.20), fato que suscitou a compreensão do que o estudo dos autores deveria abarcar.
Na sequência, foi analisada entrevista de uma alta funcionária (Odette), que serviu de exemplo típico dos processos encontrados nas falas dos empregados, classificadas em quatro categorias: atitudes contraditórias, retomada das contradições, derrapagem do discurso e entrelaçamento dos temas (desordenamento das instâncias), como é descrito no quadro abaixo:

Atitudes contraditórias:
+
-
Vantagens apreciadas e ideologia aprovada.
Dependência e ideologia criticada, tímida e alusivamente.
Oportunidades de carreira para as mulheres, promessas cumpridas, promoção em três anos, salário dobrado.
A funcionária sente-se aprisionada pelas vantagens, com grande pressão do trabalho e  angústia.
Princípios da empresa aplicados, em comunhão com a forma de Odette pensar: respeito ao interesses dos indivíduos.
O dinheiro governa o mundo.
O poder da empresa é tranqüilizador.
Grande empresa americana multinacional com interesses diversos. O trabalho é duro.
Pode-se terminar a carreira decentemente. Trabalho interessante e bem remunerado. Odette gosta de mudanças.
Mas reflete quando for mais velha...
Retomada das contradições:
Ambivalência a todo o momento. A cada afirmação positiva de Odette, uma contrapartida negativa e vice-versa. Segundo os autores, as contradições serviam de atenuantes no “momento em que elas poderiam desembocar num conflito aberto com a empresa” (p.23). O conflito de Odette era interno, psicológico.
Derrapagem do discurso:
O discurso, através da introdução de novos elementos, fazia a mediação que impedia Odette de explodir em conflito. A adesão que a ideologia da empresa provoca barra uma contradição que mais me parece uma “panela de pressão”. Além disso, a instância econômica se interpõe a uma contradição entre a ideologia da empresa e a realidade de exploração.
Entrelaçamento
dos temas
e desordenamento
das instâncias:
Os temas se entrelaçam no jogo das contradições controladas. As instâncias (econômica, política, ideológica e psicológica) se misturam nos fragmentos do discurso (na verdade de qualquer discurso).
Os autores externam o cuidado necessário com relação a leitura da empresa não tender a informações sobre a realidade externa (perigo positivista) ou apenas considerar o universo mental do interessado (perigo idealista).
Portanto, o objetivo da pesquisa, resumiu-se em encontrar um método que permitisse recuperar e explicar as contradições, derrapagens dos discursos e desordenamento das instâncias, encontradas nas políticas da própria empresa, compreendendo os recursos através dos quais a organização provoca essas reações contraditórias e a “retomada permanente das contradições a fim de evitar conflitos” (p.24).
1.2. Mediação
A empresa pesquisada segue políticas contraditórias que aliam vantagens integrativas do indivíduo à organização, à aceitação das restrições impostas, bem como a exploração e a dominação pela mesma. A mediação aqui é subjacente do sistema econômico e intermedia os objetivos dominantes de um lado, e a percepção do trabalhador quanto às coerções da empresa (que poderia levá-lo ao conflito), de outro. Tais vantagens separam o indivíduo dos outros trabalhadores a fim de evitar os conflitos coletivos.
Neste sentido, o conceito de mediação é “um processo que transforma uma contradição subjacente entre os trabalhadores e a organização em uma contradição interna às políticas da organização” (p.26), evitando, desta forma, que as mesmas cheguem a explodir em conflito. A organização tende a antecipar uma solução pronta, integrando, desta forma, o trabalhador a seus objetivos específicos e também às relações da produção capitalista.
Em outras palavras, o processo de mediação une as restrições (coerções) e os privilégios oferecidos ao indivíduo, ocultando, assim, as contradições entre os objetivos da empresa (os mesmos do sistema capitalista, ou seja, lucro e dominação) e os objetivos dos trabalhadores.
Eis as contradições da empresa capitalista: desenvolver as forças produtivas com iniciativa, atividade intelectual, criação, cooperação, etc., dando aos trabalhadores toda a satisfação de ordem econômica, política, ideológica e psicológica, com altos salários, responsabilidade, momentos de prazer, entre outros, ao mesmo tempo em que garante o controle, subordinando as forças produtivas aos objetivos da empresa e do capitalismo. Desta forma, a mediação assegura o controle, porque a contradição é “resolvida” nos moldes da empresa e pela empresa, destituindo os trabalhadores de organizar eles próprios a produção. “As contradições do sistema capitalista nem sempre são diretamente observáveis, pois são ocultadas e transformadas pelos processos de mediação” (p.28).
1.2.1. Tipos de mediação:
Instância econômica
Política de altos salários, possibilidades de carreira, discriminações reduzidas. Aceitação dos objetivos capitalistas (lucro).
Instância política
Diretrizes centrais da empresa. Desenvolvimento da interiorização de regras e princípios, que são aplicadas e reproduzidas pelos próprios indivíduos. Autonomia controlada.
Instância ideológica
Ideologia dominante produzida pela empresa fornecendo subsídios a várias interpretações individuais, mas não contraditórias com a ideologia da empresa.
Instância psicológica
A organização funciona como “máquina de angústia”, provocada pelos controles, exigências ilimitadas, mas compensada por prazeres como conquistas, dominação dos clientes, dos colegas, de se superar, entre outros. Isso integra, de forma inconsciente, os trabalhadores à empresa.
Os autores evidenciam que existem mediações entre as instâncias, cujos diversos tipos se relacionam mutuamente, “tampando buracos”, “sufocando as contradições nascentes” (p.29).
1.3. Introjeção das contradições
A contradição é interna à organização mas externa ao indivíduo” (p.26). Ela é introjetada pelo indivíduo que resulta numa contradição psicológica, num conflito interno. O consciência das angústias, bem como das satisfações é individual, sem ligação com a situação dos outros.
1.3.1. Deslocamento e transformações das contradições
1.3.1.1. A combinação de restrições (coerções) e privilégios aos indivíduos integra-os à organização ao mesmo tempo em que impede a formação de grupos autônomos opositores. As contradições dos trabalhadores são absorvidas pelas políticas contraditórias da organização.
1.3.1.2. O indivíduo, isolado dos outros trabalhadores, introjeta as restrições (coerções) e as vantagens da organização, que se transformam em angústia e prazer. “Os desejos espontâneos do indivíduo são recalcados em suas relações com os outros, pois fazem pesar sobre ele uma ameaça insustentável” (p.30). Assim, o empregado vive em um eterno conflito psicológico: ao mesmo tempo em que se sente protegido pela organização, sente-se também ameaçado por ela; feliz e infeliz; livre e drogado; satisfeito e aprisionado, totalmente identificado com os objetivos e valores da organização, mas sofre por sua servidão, em suma tudo que o prende à empresa é ao mesmo tempo fonte de prazer e angústia.
Assim, a organização consegue...
·         Individualizar as contradições (infelicidade privada);
·         Psicologizar todas as instâncias das contradições, explorando em seu proveito as contradições psicológicas individuais.
1.4. Consolidação Ideológica
Aqui o conflito psicológico ganha ares benéficos, uma vez que a produção de uma ideologia se estabelece como uma fonte suplementar de satisfação ao indivíduo, pois o impede de explodir em um conflito externo, mantendo a contradição em nível intra-individual.
1.4.1. Organização como um sistema de mediações
Os autores fazem plena distinção entre os conceitos de organização, do racional “conjunto de dados, objetivos, capital, mão-de-obra, procedimentos, (...)”, ao “conjunto dinâmico de respostas e contradições” (p.31). Trata-se de um sistema que permeia as contradições entre os trabalhadores e a empresa e o sistema social e objetiva evitar ou atenuar os conflitos, integrando-os em um sistema social unificado. Este sistema sucede à época da exploração visível, dos afrontamentos brutais, cujas armas são a interiorização das restrições (coerções), da institucionalização dos conflitos, da linguagem normalizada e unificada da “boa administração" (p.31), do estabelecimento de regras, do sequestro da subjetividade (FARIA & MENEGHETTI, 2009). Na verdade, o que mudou foi o sistema de controle da sociedade e das empresas capitalistas.
Desde o seu nascimento, as empresas são “produtos de relações contraditórias entre grupos sociais” (p.32) e mediam, sem cessar, as contradições dos grupos sociais internos e externos. O erro está em ocultar, encobrir os processos contraditórios que dão origem à organização, de forma a alicerçar o poder dos dirigentes, mascarando-o por meio de uma linguagem racional (dados, relatórios, regras, procedimentos, etc.), sem querer ver as relações contraditórias que fundamentam, de fato, a organização. O poder dos gerentes consiste em colocar seus conhecimentos a serviço de uma ação mediadora que reduz as contradições da sociedade capitalista em desenvolvimento (p.33).
1.5. Antecipação dos conflitos
A empresa moderna e a hipermoderna não se limitam a tratar os conflitos, elas os prevê e se previnem. A empresa moderna é a da solicitude, mas também a do segredo e da manipulação. As providências não visam evitar os conflitos, mas satisfazer trabalhadores, clientes, fornecedores, manter a boa reputação da empresa na comunidade, “todos critérios positivos” (p. 34), e cujo objetivo é justamente criar respostas antecipadas aos conflitos para que orientem a conduta de todos com as quais a empresa estabelece relações, de forma a evitar que organizem-se em grupos e entrem em conflito com as finalidades da organização. O que aparece, na verdade, é tão somente as políticas da empresa. A existência do conflito é negada.
1.6. Organização moderna e hipermoderna
A organização hipermoderna caracteriza-se pelo desenvolvimento de seus processos de mediação, sua extensão a novas instâncias, (...)??? Além disso, a força produtiva também sofre modificações: intelectualização das tarefas, maior papel das ciências e das técnicas, maior divisão técnica do trabalho, interdependência das tarefas, renovação e mudança (p.35). Este sistema exige trabalhadores instruídos, que compreendam os princípios de sua ação, com iniciativa, desejando mudanças, cooperativos, entre outras características que muito modificam as condições da luta social. A organização hipermoderna assegura essas transformações no aparelho produtivo e mantém o controle sob sua orientação.
INSTÂNCIA
NA ORGANIZAÇÃO CLÁSSICA
NA ORGANIZAÇÃO HIPERMODERNA
Econômica
Salários altos; possibilidade aberta de carreira; sociedade feudal, castas, privilégios, laços de família, etc.
Salários altos; possibilidade aberta de carreira; destruição de vestígios da sociedade feudal, castas, privilégios, laços de família, etc.
Política
Ordens e interdições; chefes com papel autoritário, pequenos soberanos locais.
Autonomia controlada que assegure a administração à distância de conjuntos vastos e complexos; ordens substituídas por regras e princípios interiorizados conforme a lógica da organização; chefes como simples  intérpretes das regras da organização.
Ideológica
Domínios isolados e “puros” quanto às relações econômicas; trabalha-se para ganhar a vida; apóia-se nos aparelhos ideológicos da sociedade global (família, religião, escola) e é reforçada por eles, bem como os reforça, entretanto não os produz; respeita sua autonomia, seu clero.
Investe dos aparelhos ideológicos da sociedade global, através do estado e procura influenciar: integrar escolas, universidades, universitários; há produção ideológica conformista (vital para seu funcionamento); ambiciona tornar-se um lugar de produção de conceitos e valores.
Psicológica
Coerção, imposição, ordem.
Dominação exercida no nível inconsciente, modelando as estruturas da personalidade. O indivíduo assume a empresa, sua ideologia, suas regras, reproduzindo-as. Vive a organização como uma droga da qual não pode mais se separar. Seus conflitos são puramente psicológicos, não levando a mudança de estruturas.
Projeção inconsciente dos chefes sobre a organização que, aliás, permanece uma abstração. Há pouca informação e comprometimento. Entidade fria à qual se é hostil ou indiferente.
Deslocamento desta projeção para a empresa, que se torna lugar privilegiado da identificação, projeção, introjeção. Não é mais o chefe que é amado ou odiado, e sim a empresa que concentra os sentimentos de submissão-revolta. Dependência psicológica despersonalizada e instaurada em relação à organização. “O inconsciente não investe mais contra as pessoas em primeiro lugar, mas contra as estruturas institucionais” (p.37). O educador do homem passou a ser a própria organização. Ele troca a tutela estrita e mesquinha do chefe, por uma mais obscura e insidiosa de uma entidade impessoal que “penetra em sua vida e sua alma de ponta a ponta” (p.37).
A troca de um sistema inconsciente do tipo paternal por maternal (a organização como mãe), na qual pode retirar seu afeto e amor a qualquer momento mobiliza ainda mais sua dependência.
1.7. Gênese endógena e exógena das relações de poder – espaço sócio-mental (Vou esperar a apresentação da Rafa para entender isso)
2. A u t o n o m i a    c o n t r o l a d a    o u    t é c n i c a s    d e    a d m i n i s t r a ç ã o    à    d i s t â n c i a:
O capítulo discute a questão da descentralização providencial, como estratégia da TLTX, a qual se vale de técnicas de administração à distância para que os dirigentes sigam exercendo o controle sobre conjuntos mais extensos e mais complexos. Neste sentido, a autonomia e o controle na empresa se reforçam mutuamente, fundamentando seu sistema de dominação.
2.1. A hierarquia dos controles
A TLTX concebeu o sistema de decisão em três níveis hierárquicos: (i) mundial (pesquisa-desenvolvimento e investimentos financeiros); (ii) continental (produção); (iii) nacional (comercialização).
2.1.1. Nível mundial (política de pesquisa e desenvolvimento)
A companhia centralizou no nível mundial sua política de pesquisa, entretanto, por razões políticas, descentralizou, de forma parcial, em laboratórios fora dos EUA, muito embora sem domínio da concepção dos produtos, apenas de alguns mecanismos, prevenindo assim qualquer tentativa de autonomia nos centros de pesquisa.
2.1.2. Nível continental (política de produção)
A política de produção da TLTX consiste em não realizar a produção completa de um equipamento em um único país, ou seja, um mesmo equipamento pode conter peças fabricadas em diversos países. O motivo é que, desta forma, além de manter a interdependência das filiais, cria o impedimento de algum país ter o controle absoluto sobre uma entidade. Além disso, a empresa também se beneficia da diferença de custos de mão-de-obra, bem como favorece seu desenvolvimento comercial no mundo.
2.1.3. Nível nacional (comercialização)
Cada filial gere sua clientela, entretanto não pode definir que produto irá vender. Esta autonomia é limitada, uma vez que a política comercial é imposta pela direção mundial e controlada pela direção continental.
Assim sendo, os autores conferem sua hipótese de que o lugar de aplicação dos mecanismos de poder se encontra na própria estrutura da organização e não apenas nas relações entre os indivíduos e os grupos.
2.2. As regras
As políticas elaboradas pela direção mundial são definidas por regras precisas, registradas em manuais. O conjunto de atividades de cada indivíduo é codificado pelas mesmas, delimitado com precisão (são planificadas e formalizadas). Trata-se de um sistema dinâmico (as regras são constantemente remodeladas), auto-regulado (leva em conta seus próprios efeitos e modifica-se em função de seus próprios resultados) e baseado na adesão (integra reações e aspirações).
2.2.1. A concepção das regras
É competência da direção mundial (americana) que leva em conta algumas sugestões de encarregados de sua aplicação, com pesquisas que dão a impressão, aos funcionários, que eles realmente participam da implantação de dispositivos que delimitam seu campo de atividade. Além disso, nada parece imposto pela direção mundial e sim fruto de uma obra coletiva. Na TLTX, o poder é detido por aquele que cria a regra do jogo, atualizado por si próprio e que desobriga o criador de participar do jogo ou influenciar os participantes.
2.3. A autonomia controlada
2.3.1. A aplicação das regras
É essencialmente nos modos de aplicação das regras que reside o campo de autonomia dos indivíduos” (p.52). Cabe aos executivos, adaptar as regras. “O que é subjetividade para um responsável financeiro cuja função e todas as regras do seu exercício são determinadas fora dele?” (p.53).
2.3.2. Diferenciação no campo de autonomia
2.3.2.1. Nível hierárquico: poder da direção mundial baseia-se no cumprimento restrito das regras. A direção das filiais encontra autonomia na interpretação.
2.3.2.2. Campo de aplicação: respeito mais rigoroso às regras em relação ao exterior. A empresa precisa ter (ou, pelo menos, parecer ter) uma só linguagem perante o mercado externo.
2.3.2.3. Natureza das regras: por exemplo, o rigor financeiro, por ser área de risco, o que difere do, digamos, setor de treinamento ou mesmo recursos humanos.
2.3.3. Jogo com as regras
Os autores evidenciam a entrega dos empregados neste jogo, transgredindo não somente as próprias regras, como também suas aplicações implícitas na estrutura. Esse desvio realiza três funções: (i) mediação das contradições; (ii) manutenção da coerência do sistema; e (iii) integração dos agentes.
2.3.3.1. Mediação das contradições: a empresa valoriza o respeito às regras, entretanto permite suas transgressões, bem como desloca a responsabilidades para as mãos dos empregados que acabam assumindo seus riscos e perigos, pessoalmente. Isso faz a filial funcionar (seria o zelo?).                                                                                                                                              
2.3.3.2. Manutenção da coerência do sistema: a empresa autoriza toda prática que favoreça seu desenvolvimento, entretanto, não a reconhece formalmente. Os indivíduos, ao exercer sua autonomia, não estão respaldados, pois o sentimento é de “afronta” à organização, mesmo enquanto “a servem” (nossa... que contradição...). “A existência de uma ruptura entre a ética e a prática seria de uma natureza tal que provocaria uma desmotivação no trabalho e uma desconfiança por parte dos clientes” (p.57).
2.3.3.3. Integração dos agentes:  as regras podem ser flexíveis, mas a “regra do jogo” não, ou seja, os princípios ideológicos fundamentais da organização devem ser aceitos sem reserva (carga de trabalho e sacrifícios). “Para jogar o jogo é necessário admitir a regra (...)” (p.58). Não há lugar para negociação, é aceitar ou renunciar.
2.4. O controle das regras – STAFFS
O sistema de decisão mudou. Os responsáveis hierárquicos e funcionais disputam por intermédio da aplicação de regras, cada um na sua “zona”. Sendo assim, cada responsável se vê controlado pelo conjunto dos outros. O poder agora pertence a uma estrutura abstrata de regras de funcionamento, tomando a forma de uma rede de controle: um conjunto de pessoas que controlam outro conjunto de pessoas do nível inferior e são controlados por outro conjunto de pessoas do nível superior. Todos devem assegurar a conformidade das regras. “O controle realiza a síntese contraditória entre a concepção da regra e sua aplicação. Ele permite ao mesmo tempo que a regra não seja imposta brutalmente e que não seja objeto de interpretações abusivas” (p.60).
2.5. Predominância dos controles financeiros
A política financeira da empresa é prioritária e é controlada por um sistema financeiro rigoroso. O objetivo é a manutenção da taxa de lucro, cujas decisões pertinentes têm incidências consideráveis nas condições de trabalho. A supremacia ao lucro conduz à valorização de serviços e pessoal em função tão somente dos recursos financeiros que propiciam à empresa. O indivíduo vale o que resulta de lucro à corporação. Por outro lado, ele (o indivíduo) está persuadido de ter contribuído para o desenvolvimento da empresa, a ponto de não conceber a existência da mesma sem o fator “lucro”.
2.6. A despersonalização das relações de poder
O antigo sistema de autoridade pessoal do chefe entra em contradição com o sistema de regras. Assim, a autoridade entra em crise, cujos sintomas vão da “não tomada de decisões” à “sanção de quem as toma”. O poder da regra afasta os dirigentes que almejam apenas manter sua autoridade. A questão não é a falta de poder, mas seu deslocamento (a limitação da autoridade é percebida como anulação de poder), uma vez que é “desterritorializado”. Este problema de crise de autoridade reflete diretamente nos mecanismos de modificação das condições de trabalho. Ninguém se compromete com nada. Segundo os autores, há nostalgia da parte dos empregados que pareciam concordar (talvez por estarem familiarizados) com o poder do tipo hierárquico.
“As regras editadas pela corporação constituem uma proteção contra a autoridade dos indivíduos (...)” (p.69), evitando arbitrariedades, bem como acabando com abusos e o caráter subjetivo dos julgamentos.
Na verdade, a defesa contra as arbitrariedades dos chefes esconde o reforço dos mecanismos de poder e controle na organização, que é apresentado como uma “ajuda” e que, pelas inúmeras vantagens “aparentes”, faz com que as pessoas ignorem suas restrições. O sistema de regras é consolidado ideologicamente, constituindo a imagem da organização como “boa”, “protetora” e transferindo a culpa ao homem “mau”, “perigoso”, etc. “O culpado não é aquele que age contra sua consciência, mas contra a regra” (p.69). Assim, a organização do trabalho se reforça não apenas na racionalidade, mas das construções simbólicas que a mesma permite. O sistema de regras é vivenciado como “protetor”, pois instaura um quadro de identificação de sobrevivência do indivíduo e da empresa.



[1] Pedagoga com especialização em Psicologia do Trabalho (UFPR) e MBA em Marketing (IBMEC); Mestranda da FAE; rossanaflor@gmail.com.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Preparando a viagem para Maringá

Amanhã à tarde, estaremos na estrada: Arlete, Rafa, Thais e eu.

Quatro colegas rumo à Maringá (PR), na I Jornada Internacional de práticas clínicas no campo social. O evento contará com as presenças de não menos que Vincent de Gaulejac e José Henrique de Faria.

Neste espaço, apresentaremos nosso artigo (pelas mãos da colega Thais):


SEQUESTRO DA SUBJETIVIDADE E O PROGRAMA DE TRAINEE NAS MELHORES EMPRESAS PARA SE TRABALHAR


RESUMO

Entende-se como sequestro da subjetividade o processo de apropriação planejada da concepção de realidade do sujeito, por parte da organização, de forma sub-reptícia, furtiva e às ocultas. Este processo priva a liberdade do sujeito de se apropriar da realidade e ordenar seu próprio saber, ficando a mercê dos saberes e valores da organização, através de um tipo hábil de manipulação de comportamento, capaz de seduzir e envolver as pessoas. Considerando as teorias Economia Política do Poder e Psicossociologia, foram analisados 14 dos programas de trainee das empresas consideradas as melhores empresas a se trabalhar, com o propósito de descrever o processo de sequestro da subjetividade nestas práticas organizacionais. No estudo foi identificado que os programas de trainees introduzem e familiarizam o jovem ao modelo e aos valores da empresa, a partir da promessa de carreira, sucesso e de pertencimento. Entretanto, as promessas adjacentes aos programas, vão além dos aspectos profissionais, atingindo a subjetividade do trabalhador, criando uma ilusão de reconhecimento, bem como um sentimento de pertença e satisfação da demanda de amor. Observa-se que as mesmas promessas que pretendem desenvolver a condição profissional atuam como mecanismos de controle, fazendo com que o sujeito internalize os desejos e valores da empresa, tomando-os como seus. Assim, o controle da organização ocorre muito mais em um nível subjetivo que propriamente físico, num panoptismo que assegure o amor à empresa  e, consequentemente, os resultados da organização. Esta pesquisa conta com o apoio financeiro da Fundação Araucária.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

AULA 6 - ORGANIZAÇÃO E COMPORTAMENTO

Banalização da Injustiça Social
Christophe Dejours
Cap. (1)
Banalização do Mal
(1) O desempregado (primário ou crônico) passa por um processo de dessocialização progressivo e sofre, podendo até chegar a adoecer mental ou fisicamente, pois tem afetados seus alicerces da identidade (p.19);
(2) Há uma clivagem entre sofrimento e injustiça. O sofrimento só suscita solidariedade/protesto quando é percebido como resultante de uma injustiça (p.19);
(3) Se há resignação pela dissociação de sofrimento e injustiça, então seria isso um fenômeno sistêmico, sem influência? Uma causalidade do destino? Dejours acredita que é exterior ao sujeito (p.20);
(4) Ele coloca como um processo de adesão ao discurso economicista, que dissocia a adversidade (sofrimento alheio) da injustiça (p.21);
(5) A exclusão e adversidade infligidas a outrem em nossas sociedades, sem mobilização política contra a injustiça, derivam de uma dissociação estabelecida entre adversidade e injustiça, sob o efeito da banalização do mal no exercício de atos civis comuns por parte dos que não são vítimas da exclusão (ou não o são ainda) e que contribuem para excluir parcelas cada vez maiores da população, agravando-lhes a adversidade (p.21);
(6) Dejours busca analisar o processo que favorece a tolerância social para com o mal e a injustiça, e através do qual se faz passar por adversidade o que na verdade resulta do exercício do mal praticado por uns contra os outros (p.22);
(7) Para Dejours, todos nós (a grande maioria) participamos na banalização do mal (p.22);
(8) “Compreender, para Hannah Arendt, é uma atividade sem fim, pela qual nos ajustamos ao real, nos reconciliamos com ele e nos esforçamos para estar de acordo ou em harmonia com o mundo” (p.23);
(9) A tolerância social também se deve a toda sociedade que se transformou qualitativamente, com reações diferentes no que tange ao sofrimento, à adversidade e à injustiça. Indignação atenuada, bem como atenuada também a mobilização coletiva em prol da solidariedade. Se há ação coletiva, é mais uma reação que propriamente uma ação: uma reação ao intolerável (p.24);
(10) Desenvolvimento da tolerância à injustiça: a falta de reações coletivas de mobilização é que possibilita o aumento progressivo do desemprego e seu estrago psicológico e mental (p.24);
(11) Novos métodos de gestão de empresas: questionamento progressivo do direito do trabalhador e das conquistas sociais, acompanhados não apenas de demissões, mas de uma brutalidade nas relações trabalhistas que gera sofrimento (p.25);
(12) Denúncias sem conseqüência política, sem mobilização coletiva concomitante que mantém a crescente tolerância à injustiça (p.25).









Banalização da Injustiça Social
Christophe Dejours
Cap. (2)
Sofrimento e Trabalho
Formas típicas de Sofrimento
Medo da incompetência
(1) É o sofrimento dos que temem não satisfazer as imposições da organização do trabalho: horário, ritmo, formação, informação, diploma, aprendizagem, nível de instrução, ideologia da empresa, etc. Muitas vezes, os trabalhadores não têm como saber se suas falhas se devem à sua incompetência ou anomalias do sistema técnico. De qualquer forma, é a angústia de não estar à altura, de se mostrar capaz de enfrentar situações incomuns, incertas e que exigem responsabilidade (p.30-31);
(2) ZELO NO TRABALHO: É tudo aquilo que os operadores acrescentam à organização prescrita para torná-la eficaz, que empregam individual ou coletivamente e que não depende da “execução”. O trabalhador mobiliza seus impulsos afetivos e cognitivos da inteligência (p.30). É impossível cumprir os objetivos da tarefa respeitando somente ao que está prescrito. Portanto, o processo de trabalho só funciona quando os trabalhadores beneficiam a organização do trabalho com a mobilização de suas inteligências, individual e coletivamente, mesmo que usadas “semiclandestinamente”, o que nos remete à idéia de um outro fator motivador do zelo: o medo como motor da inteligência. (p.56).
Pressão para trabalhar mal

O trabalhador sabe o que deve fazer, mas não pode fazê-lo porque o impedem as pressões sociais do trabalho (ambiente social péssimo, obstáculos, sonegação de informação, prejuízo de informação, etc.), constrangendo-o por métodos e regulamentos incompatíveis ente si (p.31-32). Há sofrimento ético.

Sem esperança de reconhecimento
(1) O reconhecimento é fundamental na dinâmica da mobilização subjetiva da inteligência e da personalidade do trabalho, permitindo a transformação do sofrimento em prazer, pois dá sentindo não só ao trabalho, mas ao esforço, à angústia, à dúvida, à decepção. O reconhecimento implica na construção da identidade do sujeito e inscreve o trabalho na dinâmica da realização do ego. A identidade constitui a armadura da saúde mental. Quando o reconhecimento não acontece, o sujeito se vê reconduzido somente ao seu sofrimento. Num círculo vicioso e desestruturante, podendo levar à doença mental (p.34-35);
(2) DIMENSÃO PÁTICA DO TRABALHO: Dimensão que remete ao sofrer e ao sofrimento, ao padecer e à paixão, com suas conotações de passar por, sentir, experimentar, suportar, agüentar situações que gerem dor ou prazer (p.45).
Sofrimento e Defesa
(1) Em vez de detectar doenças mentais do trabalho, registrou-se que a maioria dos trabalhadores permanecem na “normalidade”. Como conseguem não enlouquecer? A normalidade é interpretada como o resultado de uma composição entre o sofrimento e a luta contra o sofrimento no trabalho, contra as desestabilizações psíquicas provocadas pelas pressões do trabalho. A normalidade não implica em ausência de sofrimento, mas uma normalidade sofrente (p.36).
(2) Se o sofrimento não se faz acompanhar de descompensação psicopatológica, é porque contra ele o sujeito aplica defesas que o controlam. As estratégias coletivas de defesa são construídas e empregadas, pelos trabalhadores, para esse fim (p.35);
(3) As estratégias defensivas podem contribuir para tornar aceitável aquilo que não deveria sê-lo. Cumprem papel paradoxal, porém capital, nas motivações subjetivas de dominação. Por outro lado, necessárias à proteção da saúde mental contra os efeitos do sofrimento, elas também podem funcionar como uma armadilha que insensibiliza a pessoa contra aquilo que a faz sofrer (p.36).
Cap. (3)
O Sofrimento Negado
Formas de Negação do Sofrimento
A negação pelas org. Políticas e Sindicais
(1) É a recusa sindical de levar em conta a subjetividade no trabalho. A organização da tolerância ao sofrimento psíquico, à adversidade, é, em parte, resultado da política das organizações sindicais e esquerdistas (p.40);
(2) O silêncio social sobre a injustiça e a adversidade, estaria ligado ao descompasso histórico das organizações sindicais com a questão da subjetividade e do sofrimento, o que provocou um enorme atraso em relação às teses do liberalismo econômico (p.40).
Vergonha e inibição
da ação coletiva
(1) A indiferença pelo sofrimento psíquico dos que trabalham abriu caminho à tolerância social para com o sofrimento dos desempregados. Com o desprezo dos sindicatos, o campo ficou livre para as inovações gerenciais e econômicas, que sempre beneficiaram os rendimentos financeiros e a desigualdade das riquezas, bem como a adversidade social, o sofrimento e a injustiça, mascarados nas “culturais empresariais” e nas novas formas de gestão. Promessa de felicidade para quem se “encaixasse”. A vergonha de protestar quando os outros são mais desfavorecidos. O empregado que sofre por causa do trabalho é encarado com indignação (afinal ele está empregado!), numa insensibilidade à sorte maior dos que sofrem por falta de trabalho (p.40-44);
(2) Exemplo do suicídio e da força desumana para que todos “esqueçam” o episódio (p.44);
(3) O sujeito que sofre no trabalho é frequentemente levado, nas condições atuais, a lutar contra a expressão pública de seu próprio sofrimento. Afetivamente, ele pode assumir uma postura de intolerância com sua emoção, provocada pelo sofrimento alheio, bem como uma atitude de indiferença e intolerância para com o que provoca seu sofrimento (p.46);
(4) A impossibilidade de exprimir e elaborar o sofrimento no trabalho constitui importante obstáculo ao reconhecimento do sofrimento dos que estão sem emprego (p.46).
Surgimento do medo e submissão
(1) O desemprego é o grande fantasma, uma constante ameaça. Os trabalhadores submetem-se às novas formas de dominação (com a ameaça constante da precarização) porque vivem constantemente com medo, o que gera condutas de obediência e de submissão. Desliga o sujeito do sofrimento do outro, bem como dos que estão longe de seu universo (desempregados e excluídos) e de seu sofrimento (p.46-52);
(2) A principal preocupação, do ponto de vista subjetivo, é a resistência: capacidade de agüentar firme o tempo todo, sem relaxar, sem se importar em machucar as mãos, sem se ferir e sem adoecer. A pressão e ritmo do trabalhão são infernais mas ninguém reclama mais (p.47);
(3) O medo produz uma separação subjetiva crescente entre os que trabalham e os que não trabalham (p.52).
Cap. (3) ...continuação...
O Sofrimento Negado
Da submissão à mentira
(1) Os gerentes sofrem porque tem alguma noção da situação de seus subordinados e de seu sofrimento, das dificuldades reais que eles enfrentam para realizar seu trabalho. Outrossim, eles também sofrem com as formas de gerenciamento, como nas reuniões com a direção em que um gerente se vê na berlinda, submetendo-se a longas reprimendas, por sua incapacidade de “dar conta” de suas tarefas e assumir suas responsabilidades. Fica a dúvida: seria um prenúncio à precarização de seu trabalho ou um pretexto para sua demissão? E não importa a vida profissional pregressa do indivíduo, dentro da própria empresa. É como se os gerentes não tivessem “passado” dentro da organização. O gerente fica embaraçado ao dar explicações, hesita, propõe interpretações vagas, muito defasadas em relação aquilo que sabem. Exibem uma confiança aparentemente  autêntica na qualidade do trabalho e na perenidade da empresa. Para Dejours, sem a confiança no sucesso da empresa, ou mesmo o triunfalismo dos gerentes, o sistema entraria em crise (p.53-54);
(2)  MANIPULAÇÃO DA AMEAÇA: os gerentes encontram dificuldades em tornar visíveis suas próprias dificuldades, pois os tornaria muito vulneráveis. A experiência da resistência do real à autoridade e à competência gerenciais tende a permanecer individualizada, secreta e dissimulada. Isso explica o silêncio sobre as dificuldades, mas não a confiança dos gerentes no sistema. Por outro lado, eles reproduzem o sofrimento nos empregados, usando a ameaça da demissão, objetivando intensificar o trabalho dos operadores bem mais do que o possível. “As dificuldades na organização existem verdadeiramente (tensões, dificuldades nos resultados, sofrimento dos empregados, precarização do trabalho), mas o sistema parece poder funcionar duradouramente dessa maneira” (p.54-58);
(3)  A PERPLEXIDADE DOS GERENTES: além do consentimento e resignação, os gerentes mostram-se colaboradores zelosos da organização. A informação destinada aos empregados é falsificada, mas graças a elas, perdura a mobilização subjetiva dos gerentes. Chama-se estratégia da distorção comunicacional  e a maioria dos empregados contribui para essa distorção (p.58-59).











Cap. (4)
A mentira instituída
A estratégia da
distorção comunicacional
(1) Baseia-se na negação do real do trabalho e das crenças alimentadas pelo sucesso das “novas tecnologias”, das ciências cognitivas e dos trabalhos sobre inteligência artificial (p.64);
(2) Esta negação também resiste a prova da verdade da experiência, quando as dificuldades encontradas não chegam ao conhecimento dos gerentes;
(3) O gerenciamento da ameaça, respaldado na precarização do emprego (em minha opinião, também pelo desemprego), favorece o silêncio, o sigilo, o “cada-um-por-si”;
(4) Leva a interpretações pejorativas das condutas humanas, sintetizada na noção “fator humano” por alguns especialistas e repercute dolorosamente na vivência do trabalho dos privados de reconhecimento. Não raro, são levados a dissimular as dificuldades que a experiência do real da tarefa lhes apresenta;
(5) Entretanto, os próprios trabalhadores tornam-se cúmplices desta negação e da doutrina pejorativa do fator humano, pelo seu silêncio, pela sonegação de informações e pela concorrência que se vêem diariamente submetidos (p.61-64).
A mentira propriamente dita
(1) Práticas discursivas que vão ocupar o espaço deixado vago pelo silêncio dos trabalhadores sobre o real e pela supressão de feedback;
(2) A mentira consiste em descrever a produção a partir dos resultados e não a partir das atividades das quais eles são decorrentes (p.64).
Da publicidade à CI
O endomarketing[1] a serviço da melhor valorização e comercialização da empresa. É preciso aumentar o valor do “passe” em nome da perenidade do serviço e do combate à adversidade e à concorrência (p.65-66).
Apagamento dos vestígios
A mentira só pode resistir à crítica quando se eliminam as principais provas em que esta última poderia basear sua argumentação. Consiste em omitir os fracassos, encobrir os acidentes de trabalho, pressionar os empregados a não denunciar, em apagar lembranças do passado que possam servir de referência positiva ao caos instaurado na atualidade. Para tanto, os “antigos” tornam-se “persona non grata” (p.66-67).
A mídia da comunicação interna
Nem sempre é fácil sustentar uma mentira instituída, de modo fundamentado. Para tanto, as práticas discursivas vão sendo progressivamente niveladas por baixo, com vistas a um discurso padronizado, sempre apelando para slogans, estereótipos, fórmulas prontas, que desgastam a semântica e consideram os leitores como cretinos e ignorantes. A comunicação sofre deformação ou falsificação para que pareça estar de acordo coma cultura da empresa, num tácito entendimento entre o serviço de comunicação e a direção (p.68-69).
Racionalização
A distorção comunicacional não acontece somente por uma estratégia experimentada passivamente pelos leitores e os trabalhadores da empresa. Ela pressupõe a ação de um grande número de pessoas em intensa cooperação. Essa mídia oferecida substitui o debate necessário para se chegar à verdade e à realidade da situação dentro da empresa, com acesso a ações e decisões racionais na gestão da organização do trabalho. Os órgãos de comunicação interna constituem, atualmente, fonte da alimentação da racionalização (muito embora não sejam os únicos) (p.70-72).
Cap. (5)
A aceitação do trabalho sujo
As explicações convencionais
(1)  EM TERMOS DE RACIONALIDADE ESTRATÉGICA: Colaborar em atos injustos exigidos pela hierarquia, não isenta ninguém da demissão. Apesar da incerteza, os gerentes colaboram, como se estivessem certos de suas previsões otimistas. No entanto, a ameaça continua (podendo até agravar-se) e não traz segurança alguma com relação ao emprego. “Todos sabem, todos temem, mas todos consentem”. As pessoas acabam ajustando-se aos demais para não correr o risco de “chamar a atenção”, singularizando-se (p.73-74);
(2)  EM TERMOS DA CRIMINOLOGIA E DA PSICOPATIA: Colaboradores perversos (o sujeito funciona segundo a uma moral ou ignorando a moral. Os dois extremos não se comunicam) ou paranóicos (dotados de uma rigidez moral máxima frente às demais estruturas da personalidade descritas em psicologia). Paranóicos e perversos em cargos de liderança na injustiça infligida a outrem (p.75-76).
A explicação proposta: a valorização do mal
(1) O MAL NAS PRÁTICAS ORDINÁRIAS DO TRABALHO: Tolerância à mentira (não-denúncia e cooperação), leis trabalhistas cínicas e cada vez mais freqüentes. Manipulação deliberada da ameaça: chantagem, insinuações, assédio moral, desestabilização psicológica, entre outros (p.76-77);
(2)  PARTICIPAÇÃO DAS PESSOAS DE BEM: Porque as pessoas de bem, dotadas de “senso moral”, consentem em contribuir para o mal? São mobilizadas por sua coragem, pois não se sentem confortáveis agindo assim. Muitas vezes quem decide o trabalho sujo, está protegido das vítimas por uma série de intermediários que o executam que dividem consigo a responsabilidade. Aqui existe o “juízo do reconhecimento” formulado pelos pares sobre a qualidade do trabalho (p.77-81).
O recurso à virilidade
(1) A virilidade é construída socialmente e confere ao masculino a capacidade de expressão do poder (seu parceiro deve-lhe reconhecimento, gratidão, etc.). Aqui, coragem não contribuir com o “trabalho sujo” e sim recusar-se a fazê-lo, contra tudo e contra todos. O líder do trabalho do mal é um perverso que usa do recurso da virilidade para fazer o mal passar por bem (p.81-86);
(2) A equação fuga-por-medo = falta de virilidade está tão arraigada em nossa cultura, que as pessoas, na sua grande maioria, estabelecem relação entre identidade sexual masculina, poder de sedução e capacidade de se valer da força, da agressividade, da violência, da dominação (p.86).











[1] Conjunto de ações de marketing institucional dirigida para o público interno (colaboradores, fornecedores, acionistas, vendedores).